RIO - BERLIM - RIO
Por sorte estou entre duas cidades encantadoras. Me deixo encantar por elas e, encantada, as canto.
insistência amarela
amarelo-outono
praça, bancos,
TEMPO DE LINHAS
O tempo me desenha novas linhas
Sou eu... não sou mais eu
Sendo outra, sou ainda eu mesma
As novas linhas... desenham outra de mim
Me vejo de fora
A mesma, renovada nas linhas do tempo
Linhas que me escrevem,
Descrevem a história de mim
Linhas de tempo, tempo de linhas...
De novas linhas
...onde escrevo os versos da maturidade
Essa sou eu... nova saída de dentro de mim
Antiga... guardada em mim
Eu ... desenhada com novas linhas
Linhas antigas de mim...
Sem essas linhas... quem seria eu?
Linhas que me emocionam
Me impulsionam
Também assustam, também intrigam,
Também escutam... linhas de escuta...
Linhas de versos... reversos de mim...
Barcelona 23 Nov 10
CINZA
No céu, o cinza pesa
Tonalidade uniforme e sólida
O ar parado e concretizado
Me solidifica
Fica... fico qual estátua
Estatelada na cama
Esperando o chamado do sol
Que não chama
Minha alma de galinha ainda
Aguarda a luz para o cacarejo
Cinza no quarto, na sala, na cozinha
No espelho acinzentado, me vejo
Cinza! Cinza! Cinza!
Todas as cores são lindas
Mas qualquer uniformidade
Desarmoniza...
Para resistir
Me visto em cores
E me aventuro
Onze graus afora
Frio ventado, vento esfriado...
A paisagem acinzentada
Embute detalhes e formas
Na moldura mono-cinza-cromática
Corro em busca de luz,
calor, ação, energia
Me movo e afeto o ar,
que afetado me contagia
Correndo atravesso a névoa
E repinto meu olhar,
que recomposto dos cinzas,
Vê cores onde não há.
É preciso investir e investigar
Dentre as opções de mim
Qual pode se harmonizar
Com esse lado cinza de Berlim...
Dois homens carregam
Estou no Aterro do Flamengo.
Short, camiseta, tênis. Sol, mar, Pão de Açúcar.
No Rio, faço corridas diárias, ou quase, entre Botafogo e Catete.
O desafio é correr sem perder de vista o prazer da vista mais linda da cidade maravilhosa: a Baía de Guanabara!
Atenção ao mar, louvor ao sol, amor ao céu e gratidão à vista.
Corro Feliz!
Dentro da imagem emoldurada pelo meu olhar, avisto dois homens. Homens velhos que caminham em minha direção.
No Aterro, todo mundo pode correr, caminhar, andar, parar. Se cuidar e se largar. Fashion, marombado, fofinho, magricela ou desocupado. Todo mundo pode. O Aterro democratiza.
Esses dois homens são velhos e carregam.
Carregam algo. Cada um o seu volume. Não identifico o quê.
Me chamam a atenção, e eu os observo. Se incluem no meu foco.
Andam lado a lado, no mesmo ritmo sem poder evitar um ao outro.
Por certo, não se conhecem. Não se olham, nem se comunicam.
Mas como têm o mesmo ritmo, não podem se evitar.
Os dois são velhos. Os dois carregam.
Um é negro. Outro é branco.
Os dois carregam.
O negro parece carregar o peso da vida.
O branco, um certo orgulho pela conquista do descanso merecido.
Os dois caminham.
O negro como quem não tem rumo.
O branco como quem cuida da saúde.
Os dois carregam.
Lado a lado, no mesmo ritmo.
O negro meio sem perceber a presença do branco.
O branco meio incomodado com a proximidade do negro.
Os dois carregam. O quê?
Um saco plástico cheio de lixo, cheio de resto, cheio de vazio.
Um cachorrinho bem cuidado, de pêlo branco como algodão.
O saco preto. O cachorrinho branco.
O velho negro. O senhor branco.
Um ao lodo do outro. No mesmo ritmo.
Caminham por estradas paralelas que riscam histórias distintas.
O caminhar dos dois diz muito sobre a cidade.
Enquanto caminham e carregam, contam nossa história.
Eles são a cidade. Estamos no Rio!
Eu e as Cidades
Entre Rio e Berlim
Vendo Berlim do Rio
Vendo Rio de Berlim
Privilégio
Sorte
Susto
Sacrilégio
Duas cidades
Duas moradas
Vôos, caminhos
Pontes, estradas
Uma assim
Outra assada
Ambas, mutuas
Mistas, muitas
Vice e versa
Verso e conversa
Texto e contexto
Multi e culti
Meio lá, meio cá
Com elas me encanto
Me perdendo nelas,
Me encontro!